domingo, 1 de novembro de 2009

MILAGRES

Os milagres no sentido teológico. - O Espiritismo não faz milagres. - Faz
Deus milagres? - O sobrenatural e as religiões.

Os milagres no sentido teológico
1. - Na acepção etimológica, a palavra milagre (de mirari, admirar)
significa: admirável, coisa extraordinária, surpreendente. A Academia definiu-a deste modo: Um ato do poder divino contrário às leis da Natureza, conhecidas.
Na acepção usual, essa palavra perdeu, como tantas outras, a
significação primitiva. De geral, que era, se tornou de aplicação restrita a uma
ordem particular de fatos. No entender das massas, um milagre implica a idéia
de um fato extra natural; no sentido teológico, é uma derrogação das leis da
Natureza, por meio da qual Deus manifesta o seu poder. Tal, com efeito, a
acepção vulgar, que se tornou o sentido próprio, de modo que só
por comparação e por metáfora a palavra se aplica às circunstâncias ordinárias
da vida.
Um dos caracteres do milagre propriamente dito é o ser inexplicável, por
isso mesmo que se realiza com exclusão das leis naturais. É tanto essa a idéia
que se lhe associa, que, se um fato milagroso vem a encontrar explicação, se
diz que já não constitui milagre, por muito espantoso que seja. O que, para a
Igreja, dá valor aos milagres é, precisamente, a origem sobrenatural deles e a
impossibilidade de serem explicados. Ela se firmou tão bem sobre esse ponto,
que o assimilarem-se os milagres aos fenômenos da Natureza constitui para ela
uma heresia, um atentado contra a fé, tanto assim que excomungou e até
queimou muita gente por não ter querido crer em certos milagres.
Outro caráter do milagre é o ser insólito, isolado, excepcional. Logo que
um fenômeno se reproduz, quer espontânea, quer voluntariamente, é que está
submetido a uma lei e, desde então, seja ou não seja conhecida a lei, já não
pode haver milagres.

2. - Aos olhos dos ignorantes, a Ciência faz milagres todos os dias. Se
um homem, que se ache realmente morto, for chamado à vida por intervenção
divina, haverá verdadeiro milagre, por ser esse um fato contrário às leis da
Natureza. Mas, se em tal homem houver apenas aparências de morte, se lhe
restar uma vitalidade latente e a Ciência, ou uma ação magnética, conseguir
reanimá-lo, para as pessoas esclarecidas ter-se-á dado um fenômeno natural,
mas, para o vulgo ignorante, o fato passará por miraculoso. Lance um físico, do
meio de certas campinas, um papagaio elétrico e faça que o raio caia sobre uma árvore e certamente esse novo Prometeu será tido por armado de diabólico poder. Houvesse, porém, Josué detido o movimento do Sol, ou, antes, da Terra e teríamos aí o verdadeiro milagre, porquanto nenhum magnetizador existe dotado de bastante poder para operar semelhante prodígio.
Foram fecundos em milagres os séculos de ignorância, porque se
considerava sobrenatural tudo aquilo cuja causa não se conhecia. À proporção
que a Ciência revelou novas leis, o círculo do maravilhoso se foi restringindo;
mas, como a Ciência ainda não explorara todo o vasto campo da Natureza,
larga parte dele ficou reservada para o maravilhoso.

3. - Expulso do domínio da materialidade, pela Ciência, o maravilhoso se
encastelou no da espiritualidade, onde encontrou o seu último refúgio.
Demonstrando que o elemento espiritual é uma das forças vivas da Natureza,
força que incessantemente atua em concorrência com a força material, o
Espiritismo faz que voltem ao rol dos efeitos naturais os que dele haviam saído,
porque, como os outros, também tais efeitos se acham sujeitos a leis. Se for
expulso da espiritualidade, o maravilhoso já não terá razão de ser e só então se
poderá dizer que passou o tempo dos milagres.

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